Confesso que antes era uma pessoa mais interventiva, o trabalho e as preocupações desmesuradas que esta vida a chegar aos 30 me traz deixa-me muitas vezes pouco tempo e, também confesso, às vezes, pouca vontade para sequer ler o jornal e as tragédias que os políticos Portugueses protagonizam.
Mas esta notícia não é sobre política, é sobre a ausência dela. É sobre como estão a viver os Portugueses: mal.
Toda a gente sabe que o risco num investimento apenas deve ser assumido quando é calculado e antecipada a perda máxima a assumir, já num contrato o risco é geralmente repartido entre as partes ou,em muitos casos, a parte com maior capacidade para o suportar vai acabar por fazê-lo, sem, contudo, deixar de ser de alguma forma beneficiado por tal.
O risco é um risco e é analisado, discutido, pensado, repensado, negociado, enquadrado, estabilizado e só depois assumido.
Viver em risco de pobreza não é viver. Esta não é uma frase feita. Esqueçamos os números, falamos de pessoas (caramba!!). A estabilidade na vida de uma criança é essencial para que a mesma possa ser educada e sentir o conforto necessário para sonhar e criar.
Como é que se explica a uma criança que hoje pode ter algo mas que amanhã a mãe já não sabe se tem dinheiro para lhe comprar um livro porque, apesar de não ter feito nada para perder o emprego, pode vir a perdê-lo de um dia para o outro sem saber como justificar a uma criança, que hoje estão a morar numa casa mas se para o mês que vem o pai não conseguir assegurar as horas de trabalho, vão ter de ir viver para outro sítio. Não se educam crianças assim, os nossos homens e mulheres de amanhã vão ser quem?
Eu digo: daqui 20 anos vamos encontrar na nossa sociedade o reflexo do que se vê hoje nos miúdos de 6 a 10 anos.
Hoje o fosso nota-se na diferença entre os betinhas da blusa azul e meias até ao joelho com ganchinho ao lado e saia xadrez e aqueles cujos ténis do irmão mais velho estão apertados e já mal entram mas como são da Nike (quando a mãe ainda conseguia comprar) vai continuar a querer usá-los até o dedo maior os romper de vez.
Amanhã a diferença será entre a falta de qualificações de uma geração que ficou refém dos recibos verdes e da governação de uma troika que não conhece o nosso país. Mas pior, de um conjunto de adultos que nada fez para assegurar a continuidade de uma educação digna e condições de vida estáveis a quem ambiciona tão pouco quanto aquilo que são, afinal, os seus direitos.
Apesar de a inteligência não nasce no berço, contudo, não tenhamos ilusões, a betinha do S. João de Brito vai sempre ter mais oportunidades do que o miúdo da EB 2 3 de Moscavide. E até aí não vinha mal nenhum ao mundo porque existia uma certa estabilidade no miudo comum da escola de Moscavide cujos pais sabiam mais ou menos com o que contar. A diferença está a partir daqui: a corda bamba em que Portugal vive, sem respostas, sem objectivos e com pouca visão.
O que é o risco hoje, pode ser a certeza amanhã. A certeza das oportunidades que se perderam porque havia risco, os planos que não se concretizaram porque o risco era muito elevado, os sonhos que nem se sonharam porque o risco não permitiu a ousadia.
Neste risco não está apenas a pobreza que pode levar os mais pobres a não terem pão na mesa, existe toda uma classe média estagnada e com medo de dar passos em frente.
A política não mora apenas na AR, nos documentos e relatórios, mora na casa das pessoas, nos empregos, nas escolas, nos jovens que não partiram e acreditam neste país. Vamos.
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